14 de outubro de 2009

News


Gostava que me fosse mais fácil escrever, tal como era até há um ano e tal atrás. Agora chego a casa e apetece-me é ouvir música, ver séries sacadas da net, e dormir. Dormir muito. Acho que nunca gostei tanto da minha cama como agora!

Têm acontecido imensas coisas, e eu tinha a mania de escrever aqui tudo. Agora falta-me o fio de jogo. Parece que não acerto dois passes seguidos, faltam as palavras para contar as minhas histórias e os acontecimentos. Tenho muita pena que assim seja. Acho que faz parte do processo de "becoming a man" como diz um amigo meu. Um tipo agora trabalha, preocupa-se com outras coisas, e já não tem paciência para vir ao msn nem para contar o que acontece com ele.

Bem, mas vou tentar contar alguma coisa.
Agora estou numa enfermaria de medicina interna - de volta ao hospital - com um banquinho por semana. A parte dos bancos até se tem feito mais ou menos bem. Só tem aquela parte chata de ficar às vezes noites sem dormir, e depois fica-se desregulado de sonos. Há anos atrás não me custava fazer directas, mas agora custa muito ficar sem essas horas de sono.
Mas o trabalho propriamente dito nos bancos até é engraçado. O problema é a enfermaria.
Não que tenha havido imenso para fazer. Há dias que são piores que outros. O problema é que eu não sou feito para medicina interna. Odeio a enfermaria, odeio os internistas, odeio o ambiente de trabalho... odeio com todas as forças do meu ser.
Isto já vem de 3 anos a esta parte, porque no 4º, 5º e 6º ano os estágios de medicina foram os únicos que correram desta maneira.
Não gosto da forma como as pessoas se dão profissionalmente, não gosto da forma como se chateiam e se lixam umas às outras e se esfaqueiam nos costados à grande e depois vão almoçar umas com as outras (quando almoçam!) ou combinam jantares de serviço como se nada fosse.
Em suma: não estou nada motivado para estar ali, não tenho nada a ver com os internistas nem com a medicina interna, coisa que já sabia, mas que tem sido reforçada nos últimos tempos.
Não é que não lhes reconheça grande importância, valor, qualidades, etc. A verdade é que reconheço, e se calhar por isso mesmo acho que não pertenço ao meio.
Eu gosto imenso de estar com os doentes, falar com eles, cuidar deles - embora ainda não saiba nem metade do que é "suficiente", e a minha tutora relembra-me isso todos os dias - mas se antes já tinha, agora reafirmo a minha certeza de que nunca me apanhariam na especialidade de medicina interna para o resto da vida.
Eu adoro medicina, mas também gosto de muitas outras coisas que não têm directa e nem sequer indirectamente a ver com medicina. E nesta especialidade uma pessoa tem de se comprometer demasiado com o trabalho, o local de trabalho, os colegas de trabalho, o ambiente de trabalho...

Uma das coisas que me disseram ali é que eu tinha de passar a ser mau. Não vou explicar o contexto em que foi, mas era sobre o modo como me relaciono com os colegas. Fez-me pensar... e pelo contrário, fiquei convencido que gosto mais de mim da maneira como sou do que a maneira como vejo que as outras pessoas são/estão/se tornaram.
Bem sei que já vão dizer que as regras são diferentes no trabalho e que eu sou um menino, e que as coisas são sempre assim e não só onde eu estou agora. São capazes de ter razão. Mas eu vejo uma diferença entre estas pessoas e as das outras especialidades. Devem saber mais de medicina do que ninguém, mas não é só isso que conta para mim.

Acho que é preciso ser-se especial para se ser internista, ou então é preciso tornarmo-nos especiais. E eu não sou esse especial, nem me quero tornar. Só tenho uma vida. Se tivesse duas, talvez visse a coisa de maneira diferente.


Aquele ambiente tira-me energia e vontade de fazer outras coisas. Estou há imenso tempo para comentar o texto do meu amigo pedro que tem estado aqui no blog abandonado há imenso tempo, sei o que lhe quero dizer, mas as palavras não saem!

Também quero lamentar o facto de ultimamente não andar a dizer nada aos amigos nem a passar muito tempo com eles, nem dar-lhes notícias. Eles sabem que eu não costumo ser assim.
Espero que seja só uma fase e que passe bem depressa!

4 comentários:

  1. Fdx mas que menino que me saíste! :P

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  2. Talvez seja. Mas não posso evitá-lo, está na minha natureza!

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  3. O estágio de medicina interna no ano comum teve exactamente o mesmo efeito em mim. Se calhar tb sou uma menina :P A verdade é que foi um estágio que me fez duvidar muitas vezes das minhas capacidades como médica porque, por um lado, é uma especialidade muito desafiante e, por outro, porque os próprios internistas tiram algum prazer em fazer-nos sentir uns inuteis! Pelo menos foi a conclusão a que cheguei na altura.. É um ambiente complicado, onde há muita competição e onde as pessoas trabalham muitas vezes no limite do cansaço. É desgastante e, na verdade, qd chegava a casa tb só me apetecia dormir. Além disso, é muito deprimente, já que se lida frequentemente com a morte, quase sempre em condições não ideais e não dignificantes para o doente. Mas olha, acaba por passar rápido, e até se aprende muita coisa... Força :)

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  4. Obrigado lily. Fico muitas vezes confuso entre a ideia de ser um inútil e incompetente, e a ideia (que não exclui a outra, na verdade) de eles retirarem prazer em ver-nos estar às aranhas.
    Pessoalmente acho que a grande maioria deles (que até são elas, e não sei se é por acaso) são pessoas amargas...
    Eu sei que tenho alguma amargura em mim que nunca consegui dissolver, mas mantenho esperança que ela não tome as rédeas do meu destino e das minhas relações com as pessoas de quem gosto e com as pessoas com quem trabalho - colegas e doentes.
    Ainda bem que disseste isso, porque os meus colegas de ano, talvez por estarem na mesma situação que eu, dividem-se entre o cansaço e medo que lhes suscita a especialidade em causa, e o fascínio que sentem por ela.
    Confesso que não consigo compreender como é que há pessoas que até sinto que têm afinidades comigo, a deslumbrarem-se como traças num candeeiro... e não conseguem ver o perigo que aquilo encerra.
    Talvez pela idade que tenho, já percebi que, no essencial, não sou diferente de todas as outras pessoas, no sentido em que a vida e as outras pessoas farão comigo aquilo que fazem com toda a gente. Confuso? É capaz. Vou tentar explicar melhor: acho que se enveredar por determinado caminho, acontecer-me-á o mesmo que acontece a toda a gente. Não tenho aquelas veleidades de pensar "ah, mas eu vou ser diferente, vou ser um médico do caraças, internista, e ao mesmo tempo farei todas as outras coisas de que gosto, porque tudo depende é da nossa vontade e não sei quê". Não é assim. A vida que escolhemos acaba por nos vencer de certa maneira. Já me aconteceu a mim, aos meus pais, aos meus amigos mais velhos... e quando tento explicar o meu ponto de vista a pessoas ligeiramente mais novas do que eu, elas parecem não me compreender e acharem que penso como um velho.
    Eu só posso dizer: não sei para onde vou, mas sei que não vou por aí... era matar o que ainda há de mim que é genuíno, criativo, e talvez aquilo que faz algumas outras pessoas acharem-me piada.

    Já ir para medicina estragou algumas coisas em mim que não recuperarei mais - claro que me deu outras, mas estaremos cá para fazer o balanço daqui a uns anos - imagino o que aconteceria se fosse para medicina interna.

    Tens razão, lily. Passará. Mas está-me a custar pa caraças...
    Um grande beijinho :)

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