24 de setembro de 2004

Diário de um Caloiro

Segunda-feira, 20 de Setembro de 2004
Finalmente paro. Paro e sento-me num banco isolado perto do edificio onde penso que vou ter aulas. Adjectivei-o de isolado, mas penso que todos os bancos que vi por aqui o são, dada a distância desértica que os separa. Pois é, é verdade, o meu primeiro dia como estudante universitário não está a ser das experiências mais gratificantes que já tive.
Depois de me ter levantado e saído de casa ainda de noite, para ir ter uma aula de análise matemática I, que nem sabia ao certo onde era, pois a única pista que tinha era um TP 3/6 que estava no horário que copiei, vim a descobrir que isso era uma aula prática, algo que nao havia na primeira semana de aulas. Senti uma enorme raiva, que ainda se agravou quando reparei que só tinha uma aula teórica ao meio dia! Teria de passar 4 horas ali sem conhecer ninguem a tentar fazer passar o tempo. Comecei por dar voltas à faculdade para a conhecer melhor, e depois cá me sentei para elaborar um rascunho deste texto que agora escrevo. Quando o acabei procurei um bar, pois ja se tinham passado umas duas horas e a fome começava a aparecer.
As pessoas aqui sao definitivamente diferentes. Aqui todos têm um aspecto bem mais adulto que eu, a maioria muito mal arranjados, com a barba por fazer e tudo mais, e com ar de quem estuda 25 horas por dia. Já nao me lembro ao certo o que fiz no resto do tempo, mas quando entrei na sala, corrijo, anfiteatro, estavam umas 50 pessoas à espera de um professor que apareceu logo de seguida: era a aula de apresentação de Análise Matemática. Nao gostei desta aula pois nao consegui ouvir muito do que o professor disse devido ao barulho feito pelos outros alunos e à incapacidade expressiva oral do primeiro (falava para dentro). Acabou a aula, diriji-me para o exterior e fui embora da faculdade almoçar com a minha namorada.
Terça-feira, 21 de Setembro de 2004
O dia começa cedo mais uma vez, ou seja, acordar ás 6:30 para ter aula ás 8:00, mas desta vez tinha mesmo aula, de informática, Introdução à Programação. Surpresa a minha quando no decorrer da aula uma rapariga (se nao era a única, não me lembro de outra ) disse ao professor que era de engenharia geográfica. Fiquei espantado mas contente, e rapidamente fiz um retrato fisionómico da personagem na minha cabeça. Uma pessoa dos seus 20 e tal anos, magra, relativamente gira, com ar muito interessado. Devido a esta ultima característica não quis saber dela e fui embora no fim da aula à procura do meu amigo (de escola), que estava no departamento de fisica e era a ùnica pessoa minha conhecida nas redondezas.
Quando olhei para o meu horário constatei que a aula seguinte (Àlgebra) começava à mesma hora que esta última tinha acabado e portanto nao tinha intervalo. Então apressei-me para o local da aula e quando lá cheguei vi que a aula seria noutro sector da faculdade, que curiosamente era no anfiteatro ao lado de onde estava à 3 minutos atras, e numa zona longe da qual eu estava no momento. Entrei na sala e reparei no professor a gritar e esbracejar lá ao fundo. Tinha pelo menos 150 kilos, suava por todo o lado e tinha um ar de muito mal disposto. Uma rapariga sentada atras de mim perguntou-me se eu era caloiro, ao que respondi possitivamente, e ela retorquiu dizendo que este professor era muito muito lixado e só passava raparigas. Como é obvio fiquei assustadíssimo já convicto que ia chumbar. Pior fiquei quando ele disse que no tempo restante de aula (cerca de 1 hora penso eu) teríamos de fazer o exame da 2ª fase de matemática de 2004, e quem tivesse menos de 14 nao teria razão para vir as aulas pois estaria chumbado. Mas passado muito pouco tempo quase toda a gente do auditório se levantou e começou a bater palmas, muitas das pessoas à minha volta a dizer que era uma brincadeira e que era uma aula de praxe. (Enorme suspiro) Estranhamente os veteranos que me rodearam pensavam que eu era do curso de matemática, mas quando disse que era de engenharia geográfica ficaram com um sorriso amarelo.Passo a explicar: Este curso tem muito pouca gente e como tal nao há veteranos o que torna a vida de um caloiro do curso bastante complicada. Continuando:
Não saí do meu lugar, a professora de àlgebra entrou na sala e apresentou a disciplina. Quando acabou e saí da aula deparei com as praxes de matemática, e ao perguntarem-me o meu curso, encontrei um rapaz do segundo ano de engenharia geográfica! Óptimo, finalmente tinha alguem que me podia algumas noções neste mundo diferente. Pareceu-me uma pessoa muito fixe com interesses como os meus e convidou-me a fazer parte das praxes. Quando olhei para os caloiros, neste caso caloiras ( 18 raparigas 0 rapazes ) todas pintadas, com latas presas aos pés e tudo mais nao me deu muita vontade de ir com elas. Claro que vocês vão pensar que sou parvo, que era o meu paraíso e tudo, mas acho que estaria um bocado deslocado, que é para nao dizer completamente. De qualquer forma acompanhei as praxes de fora, mas, sem nada a perder, decidi juntar-me durante o almoço na cantina, onde comecei por comer sem talhetes. É Verdade, à lambidela limpei o prato de esparguete à bolonhesa!! E no meio de raparigas de matemática, foi o rapaz de engenaria geográfica que melhor se safou, quererá isto dizer alguma coisa ? ( tou a brincar =PPP ).
Bom, depois do almoço fomos de metro até à baixa, onde montamos estendal no meio da Rua Augusta a vender lápis, cantarolar músicas inventadas e fazer todo um tipo de coisas que nao lembram ao diabo, sempre envergando um Saco do lixo preto com um papel atrás em que estava escrito Π’ ( Pi-linha; Pilinha – simbologia atribuída ao único rapaz , vocês devem conhecer, eu nao conhecia.). Posso afirmar que estava errado ao principio do dia, que me diverti muito e conheci muita gente nova! :-)
Quarta-feira, dia 22 de Setembro de 2004

Hoje as aulas começaram mais tarde! 10:30 é a hora de entrada o que me safa de madrugar estupidamente. Vou para a faculdade com um sorriso, pois ja conheci colegas de matemática e começo o dia com a primeira aula a sério de análise matemática. Sentei-me junto das minhas novas amigas e tivemos uma aula em que não percebemos patavina mas que se jogou muito com o telemóvel e tudo mais. Tambem conheci nesta aula a malta do meu curso de 2º ano, que não passaram a nenhuma disciplina e pelo que me pareceu vão repetir a proeza este semestre. Acabou e aula e fui com o meu padrinho, o Tiago (o rapaz que me praxou), tratar de regularizar a minha situação, pois não me encontrava inscrito nas aulas práticas das disciplinas. Seguiu-se um almoço na cantina, onde provei uns dos piores filetes que alguma vez comi, e depois da refeição teria Introdução às Ciencias Geográficas, que é a única disciplina directamente relacionada com Geografia, e como tal, apenas a teria com os outros meus colegas, caloiros, que iria conhecer.
Ao chegar à entrada da sala deparei com 4 pessoas: Duas raparigas novas, um rapaz igualmente novo e um outro “senhor” que até parecia professor. Este último era um dos meus colegas, e tem 37 anos ( interessante..). Das outras 3 pessoas posso adiantar que uma das raparigas, que entrara para o curso com média de 18.5 e como primeira escolha tinha um ar particularmente de MARRONA, a outra rapariga tinha um ar normal, e o rapaz parecia assim um tipico jovem dos anos 90 americanos tal como os filmes os descrevem.
Cumprimentei-os sem dar confiança nenhuma e acabamos por não ter aula. Até hoje ainda nao conheço o professor. Depois desta saga geográfica foi o baptizado dos caloiros. Consegui trazer comigo as duas raparigas do meu curso, o rapaz nao veio pois ja não era caloiro. Fomos para o campo grande e o nosso batismo consistiu num balde de àgua do lago pela cabeça abaixo e toda uma panóplia de actividades de caloiros que no dia anterior já tinha praticado. Posso dizer que me diverti mais uma vez, e de seguida encaminhamo-nos para o metro, onde tentei conhecer mais um pouco as minhas duas novas colegas. Daquela mais croma só consegui saber era de óbidos e que estava num quarto alugado em alvalade. Da outra rapariga que me pareceu uma pessoa mais parecida comigo. tirei que era de Oeiras, tinha 22 anos, tinha namorado, nao bebia, e já nao me lembro muito mais, mas fiquei com ideia de que nao era assim tão parecida comigo como me pensava.
Quinta-feira, 23 de Setembro de 2004



As aulas começam as 8:00! (o que me obriga a madrugar). Não me custou muito a levantar, porque queria conhecer estes meus novos colegas com quem vou estar o resto do ano.
Mas depois de 2 horas e meia de aulas percebi que definitivamente são diferentes de mim, e que terei de arranjar outro tipo de companhia se quiser agradar à minha maneira de encarar a vida.

Chega ao fim a minha primeira semana, pois sexta-feira nao tenho aulas (eram todas práticas) e posso concluír que tive muitas surpresas. Desejo a mim mesmo boa sorte que bem vou precisar.

3 comentários:

  1. Este texto levou-me a um passeio pelas memórias de um jovem caloiro que no distante ano de 1998 se iniciou pelas lides do ensino superior... gostei bastante de ler.
    Um abraço e espero que a tua vida académica corra pelo melhor.

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  2. Jovem, gostei bastante. Como disse o Rui, este blog reavivou-me memórias passadas... Mas, como vais ter oportunidade de te aperceber, algumas coisas são bem diferentes do que tu agora julgas... keep going ah, e vai dando notícias!

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  3. Hey Vasco!
    Pensa na entrada na faculdade como se se tratasse de um upgrade abrupto no teu processo de crescimento e formação. Muita coisa acontece de repente e sem avisar, é muito mais gente, as coisas tomam uma dimensão maior subitamente... mas depressa te habituarás. A regra é: adaptabilidade! Só os mais fortes sobrevivem. No caso da tua nova faculdade, essa força é como o mal: manifesta-se de muitas formas. Tu verás isso com o tempo. As cobrazinhas adelgaçam o seu corpo para rastejar mais rapidamente por entre os canaviais ribeirinhos; algumas plantas desenvolvem folhas maiores para roubarem o sol às outras; por sua vez, alguns bicharocos aprendem a roer as raízes mais tenras dessas plantas; e há os que ficam à espera, encobertos, junto ao último charco que seca, pois sabem que as gazelas mais tenras aparecerão ali para aliviar a sede. É o mundo animal. Mas confio nos teus genes :)

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