22 de abril de 2007

Pequenos grandes heróis


Desta vez, não sou eu o autor do próximo post. Ainda não foi desta que me senti inspirado para escrever de novo. Em compensação, cedo a palavra a uma pessoa que me escreveu um texto e que, espero, não se irrite comigo por eu ter decidido divulgá-lo. Claro que gostei muito dele, também tenho direito a ser vaidoso... por outro lado, deixo-vos aqui com uma foto minha que tudo tentei para que não me mostrasse gordinho que nem um macho :p
Um grande bem-haja!

*
Pequenos grandes heróis
Nunca tinha reparado no João até ele ser da minha turma.

Um puto calado, mas mesmo calado, extremamente observador, com um brilho no olhar que confundia, sei lá eu como, alguma mágoa e uma vontade enorme de viver. Acho que só dois meses depois do ano lectivo ter começado é que comecei a entendê-lo e, lembro-me bem, foi no estágio de Pneumologia.

Estávamos sentados - pouco habitual - no corredor do Serviço à espera (usual stuff) que chegasse um assistente para nos dar uma aula. Acho que já toda a gente falava bem com o João e eu não. À primeira vista, ele não me inspirou confiança, talvez porque desconfie sempre das pessoas que parece que me lêem a alma - ou pelo menos que me pareça que estão a tentar lê-la. E o João, como se adivinhasse os meus pensamentos, disse

Epá, eu sou um gajo calado, mas sou muito observador e uso isso para fazer piadas

a propósito de estar toda a gente quase em lágrimas de riso com o que ele estava a dizer. A história parece fraca, e provavelmente o é, mas a partir desse dia - e dessa frase - comecei a aproximar-me do João. No fim desse estágio, acabei por saber de uma coisa terrível, pelo menos foi para mim sabê-lo: o pai do João estava gravemente doente há já algum tempo e isso acabava por explicar tanta coisa.

Um cancro que metastizara para os ossos, o pai que não dormia por causa de dores que a nada cediam, o João que tomara controlo da situação e era o chefe de família, o aluno de Medicina, o jovem adulto com direito aos seus interesses, um gajo com um sentido de humor e de ironia irrepreensíveis. Ele no meio de tudo aquilo - malabarista de vidas humanas, equilibrista da sua própria vida.

Um dia roubaram-me um beijo e eu, que não andava nada bem, fiquei contentíssima com isso. Cheguei a casa naquela agitação, ainda embriagada (o beijo aconteceu numa saída à noite) e vejo que o João e outros dois colegas estão num enorme regabofe e eu, no meio daquela alegria toda,

que é que fazem acordados a estas horas?

e, piada para ali para acolá,

olha estamos aqui porque o meu pai morreu esta madrugada.

O meu peito encolheu-se e eu deixei de poder respirar durante algum tempo. Senti uma dor tão, mas tão grande, um abalo tão forte, como uma chapada de mão seca numa bochecha de bebé (imagino que isso doa bastante). Ao João não lhe apetecia muito falar sobre isso, então falámos da minha desilusão amorosa e o João deu-me valiosos conselhos e ouviu-me com atenção. Naquele dia em que uma vida se perdera, e em que ele presumivelmente perdeu parte de si próprio, ele ouvia-me porque eu estava de coração partido, no seu altruísmo, na sua generosidade imensa.

O João, um puto calado, muito observador, que sempre me fez rir e que tem um coração maior do que si próprio. Um pequeno grande herói, com cara de miúdo e uma vida das antigas.

Desculpa esta porcaria de texto, João. Mas é para ti.
Joana Batista
20.04.2007

9 comentários:

  1. Inspirador. O João, não o texto claro. :) bejinhos joão*

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  2. Que bem que a Joana te apanhou! O João, que bebe Sumol Laranja, anda de bicicleta e desdramatiza com a simplicidade de outros tempos...

    Gosto muito de ti, há muito tempo.

    Como se precisasse de dizer...

    Um abracinho daqueles,

    Rita

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  3. Muito bom! :D Está muito simples e retrata em poucas linhas uma boa parte do João. ;)

    Oh Rita, não é Sumol Laranja! É Sumás Ananol! :P

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  4. Como amigo deste gajo há quase 9 anos, reconheço-me nas palavras da Joana... ao principio também o estranhei [mas normalmente estranho sempre as pessoas que depois se tornaram minhas grandes amigas, portanto até aqui tudo bem], mas depois de se revelar como um gajo fora do normal - os almoços de bolachas e Carlsberg no Centro de Cálculo, as horas e horas de mIRC e acima de tudo, as aventuras nas aulas do longínquo curso de Bioquimica [sim, para aqueles que não sabem, ele já andou com o «inimigo»] tornaram-no numa das pessoas mais interessantes que já conheci. Isto aliado a uma sensibilidade apurada e um modo de viver extremamente apaixonado por tudo [quer para o bem, quer para o mal] transformaram-no num dos melhores amigos que este gajo cinico, sarcástico e empedernido poderia ter. E sei que se pode sempre contar com ele.

    Por falar nisso, temos que combinar um joguinho de FIFA lá em casa.

    Um grande abraço, puto.

    Rui

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  5. A minha opinião é tudo menos não tendenciosa. Tal como o Rui também o conheci nos tempos Fculianos, onde um pacote de Cheerios e uma sagres (de lata) bastavam para que este se sobrevivesse!
    Uma das primeiras cenas que me lembro do joão foi um elogio feminino às suas sobrancelhas, ao que ele retroquio com: "É tipo camelo, para me proteger das tempestades de areia!"... ela não percebeu.

    Todos os que param por aqui, de uma forma ou de outra, têm uma forte ligação com o João... acho que não é por acaso.

    Forte abraço

    p.s. FIFA é pa fraquinhos, para pés esquerdos em forma de conchas da sopa!

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  6. Pro Evolution Soccer é para gajos que jogam de bengala ou para ex-glorias do futebol internadas em hospitais com ateroesclerose (maldita placa do ateroma)...

    Rui.

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  7. Caro rui, caro pedro: polémicas sobre jogos de consola à parte... convidem-me na boa, porque eu até com laranjas jogo! Conchas de sopa? Isso é bastante mau. Mas eu também tenho os meus remos :p

    Um pequeno reparo, pedro: são pestanas, e não sobrancelhas. As sobrancelhas são à becas da rua sésamo... é só uma, grande, sem interrupção na zona do nariz.
    Pode ser bastante útil quando no Outono a polícia aconselha os automobilistas a trocarem as escovas dos limpa-pára-brisas! :D

    Tanta gente a dizer coisas giras sobre mim! Isso inspirou-me a abrir uma iniciativa que é o SOS STP amigo. O nib é 555000345676345, poderão depositar a vossa contribuição, porque eu preciso de um córtex cerebral novo, e ouvi dizer que há um menino indiano que joga xadrez e que vai trabalhar para a nasa, que é o único dador compatível. Porém, a operação é muito cara, daí a necessidade que todos se unam para ajudar.
    Em troca, confeccionar-vos-ia (alguém já alguma vez conjugou o verbo desta maneira?) um belo caril, e enquanto o degustam eu tocaria peças de rara beleza em cítara!

    Obrigado, Joana. Obrigado, amigos :')

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  8. Joao, Joao...
    Beijos, muitos, tantos.. todos.
    Juanna

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