Vulpina - Eu não me importo de saber as
tuas histórias. Não é importante para mim saber (também era o que mais faltava),
mas não me importo de saber. Há quem não goste!
Acre – Não te importas, mas eu
também só conto se achar engraçado.
Vulpina - Claro, e eu faço o mesmo! Se bem
que eu não falo muito sobre as minhas histórias.
Acre – No need!
Acre - "A história da vez em que eu fui
assaltada e valeu a pena!".
Vulpina - Ahahahahahah!
Acre – “Mas oh senhor polícia, eu
não quero apresentar queixa…”.
Vulpina - Ahahahahahah! “Valeu o
dinheiro que perdi!”.
Acre – “Isto a pagar afinal é bom…
agora entendo os meus clientes!”.
Vulpina - “Eu até gostava que me
assaltasse mais vezes…”.
Acre – “Perdi cinquenta euros
que tinha na carteira... mas da próxima
vez vou subir a parada! Vou passar no mesmo beco com a minha carteira Chanel”.
Vulpina - “E deixar lá dentro a
minha morada! Com sorte vem assaltar-me a casa!”.
(Comprei umas coxinhas de frango já temperadas com colorau e mais não sei quê, embaladas. Não é o meu estilo, mas às vezes com tanto tempo de brincadeira com a minha filha, je suis obligé ... então... forno com as coxinhas de frango, com uns dentes de alho, e um limão espremido por cima, e um vinho branco e um fio de azeite... e um arroz branco que evaporou a água demasiado depressa porque não baixei o lume enquanto dava banho à miúda...).
STP - Filha, o que achas, está bom?
A minha filha (de boca cheia) - Hum hum!
...
(passados três minutos quando comecei a comer, ela de prato quase vazio...)
STP - Oh filha, este arroz está um bocadinho duro, não é? Devia ter cozido um bocadinho mais.
A minha filha - Hum... talvez um bocadinho. Mas demorava mais tempo! Pai, és o melhor cozinheiro do mundo!
"Now I have come to the crossroads in my life. I always knew what the right path was. Without exception, I knew. But I never took it. You know why? It was too damn hard! Now here's Charlie. He's come to the crossroads. He has chosen a path. It's the right path. It's a path made of principle -- that leads to character. Let him continue on his journey.".
Lt. Col. Frank Slade (Al Pacino) - Scent of a Woman
As margaridas e amores perfeitos e ervas em terra mole, que não está seca nem enlameada, e que te massaja os pés em vez de os magoar ou de os sujar.
O zumbido lento e baixinho de centenas de abelhas que esvoaçam nas suas vidinhas atarefadas pelas flores que encontram, suficientemente perto para as observares, mas suficientemente longe para não te incomodarem.
O restolhar dos teus passos, que ouves dentro e fora de ti, porque não há muito mais que perturbe o silêncio.
O riso da tua filha ao atirar areia para todo o lado, embora lhe tenhas dito - sem muita convicção - para não o fazer.
O cheiro doce e suave de toda a vegetação quente à volta a anunciar que há de vir o verão, justamente numa altura tão melhor do que ele.
As cores que competem umas com as outras pelo maior brilho e beleza, e enquanto reparas nisso a tua filha te pergunta qual é a tua cor favorita.
O sol que está quente e pode queimar, mas que deixa que à sombra a temperatura esteja perfeita para estares em trajes menores.
O riso da tua filha de cara afogueada ao mergulhar vestida no rio, embora lhe tenhas dito - sem muita convicção - que só permitias que ela molhasse os pezinhos.
O encheres o peito de ar e dares-te conta de estar tudo bem naquele momento.
Tinha-lhe dito que estava com algum sono mas podia conduzir eu.
Respondeu-me que não, que conduzia ela, que eu era um conas. Encolhi os ombros e refastelei-me no lugar do pendura, entre a porta e a mala gigante de senhora que repousava sobre a consola central.
Ainda numa localidade, antes de entrarmos em autoestrada, as lombas pareciam montanhas. Parecia que iamos de jipe num safari. A sair das rotundas logo ali uma aceleração tipo warp speed como se saísse de uma chicane para uma recta, mesmo que a cem metros houvesse outra rotunda.
Agarrei-me discretamente ao apoio da porta e fechei os olhos. Ela riu-se. "Ai estás com medinho...". Respondi que não, ensonado, a bocejar, Confio na tua condução.
Entrámos na A1. Toda google maps no mega-telemóvel do tamanho de uma raquete de pingue-pongue, a assinalar o caminho. E acelera, faixa do meio, depois esquerda, Ah-sacana-porque-é-que-estás-a-travar-não-percebo-estas-pessoas, guinada e aceleração, ruuõõõõõõnn a passar por cima da guia sonora, semibreve em Fá sustenido, depois outra guinada para corrigir. Parecia um gráfico das BTC ao segundo.
Começa a vasculhar cenas no saco que entretanto tinha colocado no banco de trás, à procura não sei do quê. Bracinho esquerdo no volante, bracinho direito com a mão a apalpar lá atrás, cabeça virada para trás, velocímetro a cento e vinte. Começa a invadir a faixa da esquerda, e, claro, flashadas de máximos não tardaram a atingir o espelho retrovisor, Ai, já saio! Que chato! Ah, vês como encontrei o bâton do cieiro? Guinada para a direita. Passa o bâton nos lábios.
Depois vai na faixa do meio e, claro, há sempre uns tristes que vão na faixa do meio a oitenta a achar que vão depressa, Ai, chatos!, ultrapassa pela direita e olha para a esquerda a ver a cara do imbecil. Continua na faixa da direita a ultrapassar automóveis da faixa do meio. Lá à frente tinha visto um camião na faixa de aceleração de um acesso a preparar-se para entrar na autoestrada. E ela vai a ultrapassar outro carro pela direita, cujo condutor decide que afinal quer sair da autoestrada e não tem acesso ao ângulo morto. Guinada para a berma, ruõõõõõõnn colcheia em Fá sustenido, aceleração brutal para warp speed (transmissão automática até pode ser muito fixe nas acelerações), Não-percebo-esta-gente, e guinada novamente para a faixa do meio para não bater no tal camião. E o pisca...?, O pisca?! Mas eles têm alguma coisa a ver com o que eu quero fazer?
Viste o tabaco?
Vasculha a mala, e depois o tablier, e lá está o tabaco na consola central. Acende um cigarro, abre as janelas. Portanto põe a música bastante mais alto, Esta é a música que uso para acordar de manhã! Por acaso peço-lhe que comece a música do início porque gosto muito. Mas depois não gosta dos graves e começa a configurar os equalizadores do som e a pôr mais alto, velocímetro a cento e trinta, bastantes carros na estrada. Guinadinha rápida de vez em quando para corrigir, algumas semifusas em Fá sustenido, pouco preocupantes.
Hear my name, take a good look
This could be the day
Hold my hand, walk beside me
I just need to say
I could not take a-just one day
I know when I would not ever touch you
Hold you, feel you in my arms ever again
Yeah, yeah, yeah
Yeah, yeah, yeah
Yeah, yeah, yeah
Yeah, yeah, yeah
Acaba de fumar, Ai, não suporto este barulho ensurdecedor!, fecha as janelas, É-de-mim-ou-estão-sessenta-graus? Mexe no botão do ar condicionado e a regular a temperatura e ruõõõõõõnn Fá sustenido em tenuto, Não te preocupes, tudo controlado!, e eu a apreciar mais de perto a textura dos blocos de betão através da janela, Ah, assim está mais fresco...
Olha, tens soninho, porque é que não dormes um bocadinho?
Não gosto de fazer, no geral, as coisas à pressa. Mas também não gosto de perder tempo.
É por isso que fico desesperado quando vejo recursos a serem usados da forma mais errada possível tendo em consideração o indivíduo e o grupo ao mesmo tempo. É quase sempre difícil influenciar indivíduo e grupo no mesmo sentido com uma determinada medida ou conjunto de acções, mas há pessoas que o conseguem fazer realmente bem. E - o que é extraordinário - sem pensarem nisso.
Estou na fila do multibanco e vejo uma pessoa bastante mais velha à minha frente a usá-lo. Claro que sei que tenho de ter paciência, e tenho. Provavelmente usa a máquina com alguma dificuldade, vê mal os números, tem medo de se enganar, e se calhar já há muito tempo que paga as contas daquela maneira. Pudesse ele escolher uma hora mais morta para fazer isso, já que está reformado... em vez de ir às 19h ao supermercado (e já que é o único multibanco num raio praticável a pé). Mas enfim. Deixa lá o velhote enganar-se e pôr várias vezes o mesmo cartão e carregar no botão do saldo dez vezes. Daqui a uns anos os miúdos de hoje irão achar o mesmo de mim noutras coisas quaisquer.
O que me irrita é malta bastante mais nova que eu, com telemóveis de mil euros com tecnologia suficiente para activar mísseis nucleares da Rússia (mas que na verdade só servem para ir aos instas desta vida) mas que vão ao multibanco levantar dez euros, depois tiram o saldo, depois levantam mais dez euros, depois tiram outro saldo, depois vão pôr outro cartão e fazem a mesma coisa, e estão ali quinhentos anos a jogar ao tetris na máquina, a carregar o telemóvel, a carregar sei lá o quê, a transferir não sei quê mais... Mens! Homebanking! Até a minha escova de dentes eléctrica dá para aceder ao banco! Ou para ver os tik-toks funkeiros da filha da vizinha.
Ai não, não! Porque me entram na conta, porque os hackers da Nova Ordem Mundial, porque os criminosos digitais! E porque vivo off the grid!
Infelizmente estou dependente destes multibancos porque são essenciais para alimentar a economia paralela e portanto tenho que me sujeitar a estas esperas. Mas custa-me. Devo ser o gajo mais rápido do meu bairro a levantar dez euros de um multibanco. Ainda os ecrãs estão a aparecer e já eu cliquei em tudo e o cartão está fora da máquina. Ainda a máquina está a gritar "retire a porra do seu dinheiro!" e já eu estou com a chave na porta de casa. Da próxima vez vou pedir a alguém que me cronometre e depois digo. Mas aposto que são menos de trinta segundos.
Mas melhor do que isso é o uso de uma coisa bastante mais recente nos supermercados. As caixas rápidas para "compras em cesto". Não sei muito bem o que isso das compras em cesto quer dizer. Sei que fazem filas maiores do que as caixas convencionais com operador. E vão para lá com aqueles cestos que pesam mais que uma retroescavadora. Ou pior, com aqueles sacos gigantes que trazem de casa, que fecham com cordinha; ou com aqueles trolleys de compras... Pousam o saco/trolley no chão. Abrem a cordinha ou o zipper. Retiram as compras uma a uma do saco/trolley e colocam na plataforma da direita. Mas tipo bué compras! Saem de lá artigos de desporto, detergentes gigantes para a roupa, compras de talho para alimentar leões, sacos com trinta papos secos... Fica a plataforma atulhada que até as laranjas saem do saco e vão parar ao meio do chão. E o saco das postas cortadas, de um bacalhau inteiro, também no meio do chão. Depois ah! É preciso passar o cartão de desconto. Depois passam devagarinho as compras pelo leitor e colocam na plataforma da esquerda. Entretanto a fila já atinge a zona dos iogurtes.
Esperemos entretanto que a máquina não avarie e tenham que aguardar que alguém lá vá desbloquear aquilo, porque senão ainda é pior. Depois pagam. Inserem lentamente o código, não vão enganar-se e transferir dinheiro para o Laos. Entretanto, claro, têm um ou dois acompanhantes que em vez de ajudarem a arrumar as compras, vão falando com a única pessoa que faz alguma coisa sobre uma merda qualquer. E depois essa pessoa retira a factura, dobra-a cuidadosamente, vértice com vértice, em acordeão, que até parece que vai sair dali um origami de flamingo, ou de orquídea, ou de uma pila, ou o caraças... e coloca-a cuidadosamente no porta-moedas. Epá mas vais meter o bacalhau no IRS? Não tinha sido mais rápido que um profissional te passasse as compras? E alguns até as arrumam no saco? Tinhas mesmo de roubar meia hora da minha vida?
Eu só vim buscar um fiúza e um pacote de cajus! Estas caixas são só para pessoas que vêm buscar vinho e frutos secos! Ou uma lata de atum para fazer com massa! Ou tampões! Não é para as compras do mês!
(Depois de cinquenta mil milhões de anos à espera na farmácia)
Acre - Poucas coisas me aborrecem mais do que vir à farmácia!
Ju - O que é que podes fazer?
Acre - Nada...
Ju - Então... (encolhe os ombros e sorri)
Acre - E depois é cartãozinho de pontos... e tem ficha de cliente connosco? E quer uma raspadinha? E sabe tomar estes medicamentos? Foda-se... o caralhinho do cartão de pontos, oh caralho da fichazinha de cliente...
Ju - Não tomaste o comprimido ontem...
Acre - Tomei tomei!
Ju - Talvez estejas a precisar de duplicar a dose.
Acre - Mas não é? Vais à farmácia, que basicamente é uma mercearia, buscar merdas para o nariz, mas parece que vais abrir uma conta num banco off-shore, oh foda-se. Só falta um sniper numa torre do outro lado da rua! Não tenho paciência.
Ju - Estás super rabugento...
Acre - E depois é quinhentas mil senhas de atendimento geral, de grávidas ou a amamentar, de pessoas com dificuldade na locomoção, de ... olha, de cães com uma bola na boca, oh caralho! (vi um cão de bola de ténis na boca a passar).
Ju - Vais-me dizer que não achas que as grávidas devem ser prioritárias?!
Acre - Se está grávida devia era estar em casa de perninhas para o ar! Não é a andar em farmácias! Que mande o marido!